Helenna Castro – CPT Sul-Sudoeste
Durante os dias 04 e 05 de setembro, cerca de cem pessoas, entre pescadores/as, marisqueiros/as, quilombolas, agricultores/as, assentados/as da reforma agrária, professores/as, pesquisadores/as e integrantes de organizações populares se reuniram em Camamu para debater os impactos do avanço da mineração e os desafios de enfrentamento na região do Baixo-Sul. O encontro foi marcado pela reafirmação da necessidade da organização do povo como forma de resistência.
Na manhã do dia 4, o Seminário “A Mineração – Impactos e Desafios para o Território do Baixo Sul” se iniciou com um momento de partilha, onde os participantes puderam se conhecer. A mesa de boas-vindas foi composta por representantes das organizações que idealizaram a atividade, o Conselho Pastoral dos Pescadores Bahia-Sergipe (CPP Ba-Se), a KOINONIA, o Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais (SASOP), a Comissão Pastoral da Terra (CPT-BA) e a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE). Muito foi ressaltada a importância desse momento de aprendizado e intercâmbio.
A programação se iniciou com a exposição de Jaine Miranda, historiadora e agente da Comissão Pastoral da Terra, que abordou a atual conjuntura da mineração no Brasil e na Bahia. Em sua fala, foi relembrado o passado colonial brasileiro, quando ocorria o saque institucionalizado dos minérios pelos portugueses através de muita violência e processo de escravização e como este reflete na atual política mineral brasileira. Foi apontado também como o atual modelo minerário adotado pelo governo baiano privilegia os interesses das empresas em detrimento das comunidades impactadas pelos empreendimentos.
Sobre a mineração na região do Sul e, mais especificamente no denominado Baixo-Sul do estado, que conta com 15 municípios, contou-se com a apresentação de Eduardo Barcelos, engenheiro ambiental e doutor em geografia, que leciona no Instituto Federal Baiano – campus Valença. O professor trouxe dados dos Cadernos de Conflitos no Campo, elaborados pela CPT, que apontam a mineração como um dos principais causadores de impactos ambientais no estado, quer seja por questão de terra / território, trabalhistas ou por água.
Um gráfico mostrou como os pedidos de pesquisa mineral tem avançado rapidamente nos últimos anos no baixo-sul, com 419 processos ativos atualmente. Também foi analisada a chegada de empreendimentos energéticos à região sem que houvesse crescimento da população ou outro fator que justificasse além da atividade mineradora, que necessita de bastante energia para operar.
Foi formada, à tarde, uma mesa com representantes das comunidades presentes, que denunciaram diversos conflitos e relataram a dificuldade em conseguir que o poder público tome providências para regular o avanço da mineração, que vem prejudicando a saúde do povo e o bioma local. Também compôs a mesa um militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM – BA), que falou sobre a realidade da região do Alto Sertão do estado, onde vários municípios vem sendo drasticamente impactos pela mineração de ferro, e ressaltou a importância da organização popular em defesa dos territórios.
Após as falas, foi exibido o documentário “Por Trás da Poeira” produzido em 2023 por estudantes de Comunicação Social da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), em parceira com a CPT – BA e o MAM – BA, que discute o Projeto Pedra de Ferro, grande empreendimento que abarca a Mina Pedra de Ferro, localizada em Caetité, a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL) e o Porto Sul, que está sendo construído em Ilhéus para escoar minérios e grãos.
Durante o debate que se seguiu, uma moradora da território quilombola Pratigi e Matapera relatou que devido às atividades de dois areais, vem ocorrendo muito desmatamento na região e o manguezal na comunidade tem sido contaminado, especialmente durantes as chuvas, o que ocasiona a diminuição do número de caranguejos e prejudica a economia local. Outra preocupação dos participantes foi com a poluição da água, que impacta pincipalmente a vida de quem tira o sustento da pesca e da agricultura. Uma moradora do Vale do Jiquiriçá alertou: “quando o trabalho começar, a gente não vai mais conseguir pescar aqui.”
No dia 5, os participantes do encontro realizaram debates em grupos para discutir quais são as possíveis medidas de enfrentamento aos conflitos atuais e à crescente demanda por exploração mineral na região. As principais formas de resistir apontadas foram a construção de uma formação continuada dos integrantes das comunidades, para que estes conheçam seus direitos e compreendam como elaborar estratégias de luta, o fortalecimento das organizações comunitárias dos territórios e a aproximação das juventudes com os processos de resistência. Ficou apontada, além disso, a necessidade da construção de mais espaços de troca de conhecimentos e experiências como este em breve.
“É o que ocorre com a saúde onde tem mineração” – Mateus Britto, militante do MAM – BA:
Quando uma mineradora
Cresce o olho numa terra
Coisa boa não se espera
Pra nossas comunidade
Logo sua atividade
Adoece o cidadão
É o que ocorre com a saúde
Onde tem mineração
Doença respiratória
É a coisa mais comum
Câncer não é incomum
Nem suicídio é novidade
Fora quando a ansiedade
Vai comendo o cidadão
É o que ocorre com a saúde
Onde tem mineração
Quando a gente adoece
Não consegue mais serviço
Vai tomando prejuízo
Passando necessidade
A maior dificuldade
Pra comprar medicação
É o que ocorre com a saúde
Onde tem mineração
A burguesia mineral
Aliada da doença
Quer assinar nossa sentença
Com sua brutalidade
A sua prioridade
É o lucro do patrão
É o que ocorre com a saúde
Onde tem mineração”
Para saber mais sobre os conflitos minerários na Bahia e no Brasil e como as comunidades vem resistindo, leia nossas produções em www.cptba.org.br ou em www.cptnacional.org.br
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