O presidente Jair Bolsonaro (PL) foi um dos maiores precursores de notícias falsas desde o início da pandemia do coronavírus, tendo, inclusive, recomendado tratamentos precoces sem comprovação científica.
Helenna Castro
No dia 26 de fevereiro de 2020 foi confirmado o primeiro caso de contaminação pela Covid-19 no Brasil. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia elaborado uma série de protocolos para a prevenção da doença, contudo, ainda não existia um tratamento reconhecido como eficaz. Dentre as recomendações estavam o uso de máscaras, higiene constante das mãos e distanciamento social. Diversos países no mundo passavam por lockdown (fechamento do comércio e de instituições, no geral) para conter a disseminação do vírus.
No Brasil, entretanto, o governo federal protelou e dificultou o estabelecimento de medidas de contenção da crise sanitária. Em discurso oficial à nação, no dia 24 de março de 2020, o presidente Jair Bolsonaro (PL) se opôs a realizar lockdown no país; disse que a chegada do vírus ao país causou histeria e pânico; atacou a cobertura dos meios de comunicação, afirmando que estes trouxeram “sensação de pavor”, ao exibirem a situação que Itália passava; propôs que alguns prefeitos e governadores abandonassem “o conceito de terra arrasada” por terem realizado fechamentos gerais; chamou o isolamento social de “confinamento em massa”; e afirmou que estavam sendo realizadas pesquisas para provar a eficácia da hidroxicloroquina no tratamento dos pacientes.
Ao longo do ano, Bolsonaro persistiu na disseminação de notícias falsas sobre a covid-19, seus possíveis tratamentos e formas de prevenção, além de desaconselhar a vacinação da população. A produção de hidroxicloroquina foi alargada e os comprimidos foram distribuídos aos hospitais pelo país, embora pesquisas do mundo inteiro concordassem no sentido do medicamento não ser eficaz no combate ao vírus.
Para Adem Ramos, médico que atuou no combate à Covid-19 no município de Canavieiras-BA, o governo federal “não teve qualquer postura de organização de combate a essa pandemia”. Critica também “o comportamento absurdo” do presidente em recomendar medicamentos (Bolsonaro também aconselhou o uso de ivermectina no tratamento precoce) que os cientistas julgavam inapropriados, quando os únicos métodos reconhecidamente adequados para a contenção da disseminação do vírus eram o isolamento e o distanciamento sociais, o uso de máscaras e a vacinação em massa. Para ele, “o incentivo [a formar aglomerações], a divulgação de fake news” contra as medidas protetivas tiveram grande impacto sobre o número de casos no Brasil.
Segundo levantamento do Jornal digital O Globo, publicado em 05 de junho de 2021, “o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), participou de pelo menos 84 aglomerações desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a pandemia da Covid-19 em 11 de março do ano passado. Em média, o chefe do Executivo brasileiro esteve presente em uma concentração de pessoas a cada 5,3 dias, algumas delas registradas na mesma data. Nas aglomerações contabilizadas durante 70 viagens e atos em Brasília, Bolsonaro usou máscara em apenas três ocasiões”. O levantamento não considerou eventos, solenidades e reuniões com autoridades, “embora em algumas situações o distanciamento social tenha sido desrespeitado”.
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, instaurada em abril deste ano, expôs os embargos colocados pelo governo federal para a contenção da crise sanitária gerada pela pandemia. Um dos pontos principais foi a protelação na compra de vacinas. Segundo o relatório, devem se investigar se Bolsonaro cometeu crimes de epidemia por incentivar aglomerações que podem potencializar a disseminação do vírus, infração de medida sanitária preventiva pela não uso de máscaras, charlatanismo pela propagando de hidroxicloroquina e ivermectina, incitação ao crime, falsificação de documento particular e emprego irregular de verbas públicas.
Em seus discursos em encontros com eleitores, o presidente se declarava a favor da “liberdade” do cidadão em decidir se vacinar ou não. Reiterava que ele não se vacinaria e, de fato, não se vacinou. Para o médico entrevistado, esse tipo de posicionamento vindo do Chefe de governo foi “algo completamente irresponsável, contra tudo que os outros países estavam fazendo”. Adem conta que chegou a morar no hospital durante os períodos mais críticos da pandemia: “quando se morria mais de 3.000 pessoas por dia aqui no Brasil, eu quase não vinha na minha casa. [...] Eu parei um tempo de assistir o jornal porque eu via aqueles depoimentos do presidente e me sentia completamente desrespeitado, ofendido”.
Diante dos números atuais de casos ativos (dentre os quais, a maior porcentagem de internados é de pessoas não vacinadas), o médico sustenta que “não existe outra palavra de ordem no momento se não vacinar. E o governo federal só fez atrapalhar com relação a isso”. Garante que a situação não está mais grave por que o Sistema Único de Saúde (SUS) já possuía um sistema de vacinação alta qualidade, com “uma logística para vacinar muito boa. Ficou faltando vacina, que o presidente ficou segurando até a última ordem”. Assegura, ademais, que se a vacinação não avançar e ocorrerem os festejos de Réveillon (entrevista concedida em dezembro de 2021) e Carnaval, outra onda da doença ou variante mais resistente e contagiosa surgir, faltarão recursos para os tratamentos, vagas de hospitais e profissionais que tenham disposição física e mental depois desse longo período de trabalho intenso: “tem muita gente desgastada emocionalmente. Foi uma guerra o que a gente viveu”.
Segundo dados do Ministério da Saúde, até o dia 24 de janeiro de 2022, mais de 24 milhões de brasileiros já foram contaminados pelo coronavírus. Mais de 624.000 deles vieram a óbito. Cerca de 70% da população está imunizada.
Helenna Castro é Comunicadora Popular e integra o Coletivo Brasil Vermelho.
Hozzászólások